Um mistério intriga as autoridades de saúde do Paraná. Os municípios da 8ª Regional de Saúde têm um dos maiores índices de mortalidade por câncer de traqueia, brônquios e pulmão. O número é duas vezes maior que as médias estadual e nacional. Enquanto, em 2008, o Brasil registrou 15,5 mortes para cada 100 mil habitantes, o Paraná teve 16,2 e a região de Francisco Beltrão, 31,8 óbitos. Os dados se igualam aos do Estado do Rio Grande do Sul, que tem as maiores ocorrências por este tipo de morte.
O problema foi identificado a partir de um estudo realizado pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) na macrorregião Oeste, entre os anos de 2004 e 2008, que comparou os casos computados nas regionais de saúde de Francisco Beltrão, Foz do Iguaçu, Cascavel e Toledo. O hábito de fumar e o diagnóstico tardio associado à resistência ao tratamento são apontados por profissionais de saúde como os principais responsáveis pelas altas taxas de mortalidade por neoplasia de pulmão.
A enfermeira chefe da Divisão de Doenças Não Transmissíveis da Sesa, Alice Eugênia Tisserant, diz que há necessidade de um estudo mais aprofundado para descobrir os fatores que levam a microrregião a apresentar dados superiores à média do estado e país.
Cigarro é o maior vilão
O pneumologista Redimir Goya observa que o cigarro é o principal causador das doenças de traqueia, brônquios e pulmão, especialmente o câncer. Ele explica que os sintomas se confundem com qualquer outra doença respiratória: tosse, catarro e falta de ar. "Somado a isso, existe o temor das pessoas fumantes de procurar o médico, porque sabem que a primeira recomendação será para deixar de fumar e nem todos estão preparados para lutar contra o vício", pontua.
Estima-se que 80% a 90% das incidências de câncer de pulmão sejam atribuídas ao fumo. Comparados com os não fumantes, os tabagistas têm cerca de 20 a 30 vezes mais risco de desenvolver câncer de pulmão.
Segundo o médico, existem evidências na literatura de que pessoas com história familiar de câncer de pulmão apresentam o risco aumentado para o aparecimento da doença, especialmente nos indivíduos que desenvolveram o câncer em idades jovens. Entretanto, é difícil estabelecer o quanto desse excesso de risco é em decorrência de fatores hereditários e o quanto é por conta do hábito de fumar. Goya não descarta a possibilidade dos fatores hereditários terem influência nos índices negativos de Francisco Beltrão e municípios vizinhos. A região é colonizada por gaúchos e o Estado do Rio Grande do Sul detém a maior taxa de mortes por câncer de pulmão do país.
Envelhecimento e câncer de pulmão
A faixa etária de maior incidência de câncer de pulmão está na população acima dos 50 anos. O chefe da Divisão de Informação e Análise da Situação da 8ª Regional de Saúde, Benvenuto Juliano Gazzi, informa que o câncer é a segunda causa de morte da região, perdendo apenas para as doenças cardiovasculares. As duas são enfermidades características da terceira idade. Em 1986, a microrregião tinha 28.941 cidadãos com 60 anos ou mais, em 2009, a quantidade de pessoas com esta faixa etária subiu para 42.000 (130%).
Redimir Goya diz que a população está envelhecendo com mais qualidade de vida. "O Sul do país segue a tendência das nações industrializadas, onde as pessoas começam a morrer por doenças causadas com o avanço da idade, ou seja, quanto mais se vive, mais chances de desenvolver o câncer. Ao contrário do que ocorre no Norte, onde há muitos casos de morte por doenças infecto-contagiosas, e do Rio de Janeiro, em que muitos vão a óbito por tuberculose", compara o pneumologista.
Câncer tem cura, basta acreditar
A descoberta do câncer na família é sempre dolorida. O tratamento é longo, exige sacrifícios, mudanças na rotina, viagens constantes e o resultado nem sempre é o esperado. Não são todos os pacientes que assimilam a doença, o desgaste psicológico e o abatimento são fatores que só pioram o quadro clínico.
Lucélia Bortot Rama conta que a família descobriu recentemente que seu pai, de 72 anos, tem câncer de pulmão. "O primeiro sintoma apareceu em março, quando ele começou a vomitar sangue", recorda. O idoso foi levado para o Centro de Saúde 24 Horas e encaminhado para um hospital da cidade. Os exames de raio-X e tomografia do tórax demonstraram uma lesão no pulmão. A biopsia confirmou ser um tumor.
Segundo ela, o pai foi fumante por mais de 60 anos e agora está reticente e não aceita o tratamento oncológico. Por coincidência, Lucélia é funcionária da Secretaria Municipal de Saúde de Francisco Beltrão no setor de agendamento dos pacientes oncológicos. "Eu vejo tantas pessoas lutando contra a doença, indo semanalmente para Cascavel fazer o tratamento e o meu próprio pai não quer se tratar", lamenta.
Fonte:Jornal de Beltrão